terça-feira, 24 de agosto de 2010

Caramuru (Fragmentos)

"Só tu tutelar anjo, que o acompanhas,
Sabes quanta virtude ali se arrisca
Essas fúrias da paixão, que acende, estranhas
Essa de insano amor doce faísca
ânsia no coração sentiu tamanhas
Que houvera de perder-se naqu’hora
Se não fora cristão, se herói fora."
"Paraguaçu gentil (tal nome teve),
Bem diversa de gente tão nojosa,
De cor tão alva como a branca neve,
E donde não é neve, era de rosa;
O nariz natural, boca mui breve
Olhos de bela luz, testa espaçosa."
Fonte: Escola Vesper

O Uruguai (Fragmentos)

"O rei é vosso pai: quer-vos felizes.
Sois livres, como eu sou; e sereis livres.
Não sendo aqui, em qualquer outra parte.
Mas deveis entregar-nos estas terras.
Ao bem público cede o bem privado.
O sossego da Europa assim pede.
Assim o manda o rei. Vós sois rebeldes,
Se não obedeceis; mas os rebeldes
Eu sei que não sois vós - são os "bons" padres,
Que vos dizem a todos que sois livres,
E se servem de vós como de escravos,
E armados de orações vos põem no campo."
Os trechos abaixo pertencem a Cacambo, chefe guarani:
"...Se o rei da Espanha
Ao teu rei quer dar terras com mão larga
Que lhe dê Buenos Aires e Corrientes.
E outras, que tem por estes vastos climas;
Porém não pode dar-lhe os nossos povos (...)"
"Gentes de Europa, nunca vos trouxera
O mar e o vento a nós. Ah! não debalde
Estendeu entre nós a natureza
Todo esse plano espaço imenso de águas."
O trecho abaixo refere-se à expressão doce de Lindóia, já morta:
"Inda conserva o pálido semblante
Um não sei quê de magoado e triste.
Que os corações mais duros enternece,
Tanto era bela no seu rosto a morte!"
Santa Rita Durão

MARÍLIA DE DIRCEU, LIRA I

Eu, Marília, não sou algum vaqueiro,
Que viva de guardar alheio gado;
De tosco trato, d’ expressões grosseiro,
Dos frios gelos, e dos sóis queimado.
Tenho próprio casal, e nele assisto;
Dá-me vinho, legume, fruta, azeite;
Das brancas ovelhinhas tiro o leite,
E mais as finas lãs, de que me visto.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!
Eu vi o meu semblante numa fonte,
Dos anos inda não está cortado:
Os pastores, que habitam este monte,
Com tal destreza toco a sanfoninha,
Que inveja até me tem o próprio Alceste:
Ao som dela concerto a voz celeste;
Nem canto letra, que não seja minha,
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!
Mas tendo tantos dotes da ventura,
Só apreço lhes dou, gentil Pastora,
Depois que teu afeto me segura,
Que queres do que tenho ser senhora.
É bom, minha Marília, é bom ser dono
De um rebanho, que cubra monte, e prado;
Porém, gentil Pastora, o teu agrado
Vale mais q’um rebanho, e mais q’um trono.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!
Os teus olhos espalham luz divina,
A quem a luz do Sol em vão se atreve:
Papoula, ou rosa delicada, e fina,
Te cobre as faces, que são cor de neve.
Os teus cabelos são uns fios d’ouro;
Teu lindo corpo bálsamos vapora.
Ah! Não, não fez o Céu, gentil Pastora,
Para glória de Amor igual tesouro.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!
Leve-me a sementeira muito embora
O rio sobre os campos levantado:
Acabe, acabe a peste matadora,
Sem deixar uma rês, o nédio gado.
Já destes bens, Marília, não preciso:
Nem me cega a paixão, que o mundo arrasta;
Para viver feliz, Marília, basta
Que os olhos movas, e me dês um riso.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!
Irás a divertir-te na floresta,
Sustentada, Marília, no meu braço;
Ali descansarei a quente sesta,
Dormindo um leve sono em teu regaço:
Enquanto a luta jogam os Pastores,
E emparelhados correm nas campinas,
Toucarei teus cabelos de boninas,
Nos troncos gravarei os teus louvores.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!
Depois de nos ferir a mão da morte,
Ou seja neste monte, ou noutra serra,
Nossos corpos terão, terão a sorte
De consumir os dois a mesma terra.
Na campa, rodeada de ciprestes,
Lerão estas palavras os Pastores:
"Quem quiser ser feliz nos seus amores,
Siga os exemplos, que nos deram estes."
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!
Basílio da Gama

Soneto

Destes penhascos fez a natureza
O berço em que nasci: oh quem cuidara.
Que entre penhas tão duras se criara
Uma alma terna, um peito sem dureza.
Amor, que vence os Tigres, por empresa
Tomou logo render-me, ele declara
Contra o meu coração guerra tão rara,
Que não me foi bastante a fortaleza.
Por mais que eu mesmo conhecesse o dano
A que dava ocasião minha brandura,
Nunca pode fugir ao cego engano:
Vós, que ostentais a condição mais dura.
Temei, penhas, temei; que Amor tirano,
Onde há mais resistência, mais se apura.
Tomás Antônio Gonzaga

Poetas da Inconfidência Mineira

Não existiu, no Brasil, uma Arcádia, como em Portugal. Um vigoroso grupo intelectual (o grupo mineiro) destacou-se na arte Arcadismoe na prática política, participando ativamente da Inconfidência Mineira.

Esse grupo, constituído por Cláudio Manuel da Costa, Tomás Antônio Gonzaga, Inácio José de Alvarenga Peixoto, Manuel Inácio da Silva Alvarenga e outros intelectuais, foi desfeito de forma violenta, com a prisão, desterro ou morte de alguns poetas, à época da repressão política em torno do episódio da Inconfidência.

Com os olhos voltados para a terra natal, esses poetas árcades iniciaram o período de transformação da literatura brasileira, que se vai efetivar, realmente, no século XIX, com os românticos. Tomás Antônio Gonzaga escreveu Marília de Dirceu, uma poesia lírica, e Cartas Chilenas, poesia satírica. Cláudio Manoel da Costa inspirou-se em Camões para escrever Obras Poéticas. Silva Alvarenga fez obras em forma clássica. Outros poetas como Basílio da Gama (O Uraguai) e Frei Santa Rita Durão (Caramuru) aparecem neste cenário.

Carpe Diem

Aproveitar o dia, viver o momento presente com grande intensidade, foi uma atitude inteiramente assumida por esses poetas.

Fugere Urbem


Os árcades buscavam uma vida simples, bucólica, longe do burburinho citadino.
Inutilia truncar
A frase em latim resume grande parte da estética árcade. Ela significa que "as inutilidades devem ser banidas" e vai ao encontro do desprezo pelo exagero e pelo rebuscamento, característicos do Barroco.

CARACTERÍSTICAS DO ARCADISMO

A ausência de subjetividade, o racionalismo, o soneto (forma poética), simplicidade, pseudônimos e bucolismo (natureza) e o neoclassicismo são umas das características do Arcadismo, disposta a fazer valer a simplicidade perdida no Barroco. Entre outros: